terça-feira, 26 de janeiro de 2010

6. Pamplona



Acordei às seis e vinte da manhã. Sem dúvida, o primeiro peregrino do albergue a abrir os olhos. Ainda matei um pouco de tempo até me levantar, mas com lanterna na cabeça, o que já havia experimentado ontem ao fazer minhas anotações, saí do quarto carregando todas as minhas coisas. Tive dificuldades para dormir, é claro. Não só pela novidade, mas também pelos roncos que estavam incluídos no pernoite.
Para dobrar meu saco de dormir, tive que investir uns dez minutos, e confesso que o pacote não ficou bom. Se minhas filhas bandeirantes tivessem assistido a cena, até consigo ver seus olhares de reprovação. Mas aos poucos, todos foram saindo e logo estávamos num bar próximo tomando nosso café da manhã, o “desayuno”. Resolvi logo cedo não pegar ainda o meu cajado. Estou na fase já prevista da eliminação de peso, e ter as mãos livres agora, me dá alguma flexibilidade até que o processo de simplificação da minha carga, para alívio de meus ombros, se consolide.
Andrea, o colega italiano, se despediu e foi à frente, em busca de seu caminho. Isso é bom por aqui; fazemos muitos contatos, conversamos, podemos até conviver mais tempo com alguém, mas numa hora ou outra, cada um toma seu rumo solitário, o seu próprio caminho.
Essa etapa foi leve. Doeu um pouco aqui, um pouco ali, mas já próximo à Pamplona, parei num posto de Correio e, rapidamente, despachei 2 Kg de minha carga para Santiago de Compostela. Poderia até mandar mais coisas, mas algumas roupas estavam úmidas e se as enviasse, teria problemas daqui a alguns dias. E um pouco mais leve, segui em frente.
Pamplona é uma cidade grande. Em comparação com os povoados anteriores, é enorme. Parques verdes, gente correndo, edifícios com detalhes arquitetônicos e, como sempre, muita história.
Acabei me hospedando num albergue central que um dia no passado, foi um convento. Quem cuida dele, são freiras. Tudo é simples como sempre, mas limpos. Não há secadora pra secagem das roupas, mas felizmente encontrei uma centrífuga, pequena, mas eficiente.
Francisco de Almería e eu saímos para explorar a cidade. Consegui descarregar as fotos digitais tiradas até agora, e fomos buscar um local para acessarmos a internet. Mandei um e-mail para casa com uma foto minha de peregrino já caracterizado.
A internet é surpreendente. Quando acessei o site do meu provedor, senti como se tivesse entrado no Brasil.
Mostrei meu “website” pessoal e alguns de meus textos ao Francisco. Ele está no negócio de perfumes, e demonstra ter bastante cultura. Fala muito sobre coisas relacionadas com história e arte. Pelo caminho, me contou sobre os templários, priorado de Sião, etc. Quem já leu o livro “O Código da Vinci”, o bestseller do momento, logo identificará o tema.
À noite, sob uma persistente garoa, fomos conhecer a catedral de Pamplona. Por fora, as colunas imponentes e a cor ocre pálida inibiam um pouco a sua beleza; mas ao entrarmos, a surpresa se estampou em nossos olhos. Internamente, embora ainda escondida pela pouca luz, não conseguimos evitar nossa admiração pelos detalhes góticos do teto. Muitas esculturas religiosas e afrescos impressionantes. A Santa Ceia com o apóstolo João muito mais próximo de Jesus, e um São Cristóvão muito respeitoso, foram as pinturas que mais nos chamaram a atenção.
Francisco ressaltou alguns dos símbolos dos templários, como as cruzes nas colunas e no teto. Sobre o altar, a pintura ilustrava um céu imensamente estrelado.
Havia uma cerimônia religiosa em andamento. Um “Terço” cantado em um ritual onde diversas pessoas divididas em filas masculinas e femininas, todas com uma idade mais avançada, cantavam acompanhadas por um órgão de som deslumbrante. Caminhavam seguindo um objeto chamado “esplendor”, e rezavam a Ave Maria e algo que me pareceu uma “ladainha”.
Próximo ao altar, havia uma lápide de um rei católico espanhol, Carlos V, junto sua rainha. Algo realmente marcante.
Estou um pouco resfriado e a garoa me preocupa um pouco, mas sigo em frente o meu caminho.
Hoje comi minha primeira “Paella” dessa viagem. Uma delícia espanhola, como sempre. Fui conhecer o local onde há uma famosa corrida anual de touros pelas ruas, e pude desfrutar de forma rápida mas plena, a beleza antiga que tem a histórica cidade de Pamplona.
As luzes já se apagaram, e é chegada a hora de apagar também a pequena luz de minha lanterna.

Um comentário:

  1. Phok´s,
    não tem o menor problema demorar 10 minutos pra enrolar o saco de dormir...rs...até hoje, essa tarefa me toma tempo!
    :)

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