domingo, 3 de janeiro de 2010

29. Dormir para chegar


A bagunça está organizada. Roupas secando na calefação e aquele monte de sacos plásticos com os objetos mais diversos ávidos para entrar dentro de minha mochila. Minha agenda eletrônica que veio a essa viagem por um mero capricho de minha parte, toca as mesmas músicas de sempre aqui do meu lado, e isso me inspira a escrever um pouco mais.
O clima está surpreendentemente bom. Amanhã promete ser um dia de sol, ainda que bastante frio. E não vejo a hora de colocar tudo nas costas e partir para os últimos quilômetros.
O último capítulo desse diário será escrito depois que eu já tiver visto as torres de lá do Monte do Gozo, depois de já ter chegado à Catedral, e de ter dado um forte abraço na imagem de Santiago. Com certeza, a emoção será do mesmo nível de toda essa aventura que um dia resolvi viver.
Durante os dias todos, estive conectado à minha vida no Brasil, ou pelo meu telefone celular, ou pelo acesso à internet dos computadores de cada bar em cada povoado por onde passei.
Os peregrinos mais conservadores, conforme já pude registrar em alguma parte desse diário, me condenarão. Mas quero registrar aqui que foram muito bons todos os momentos onde pude perceber as pessoas do outro lado da linha viajando comigo em cada passo dessa viagem. Foi muito bom sentir que as pessoas tentavam ver as paisagens através dos meus olhos, pelas minhas entusiasmadas descrições.
Não é verdade que isso tenha impedido as minhas solitárias reflexões durante todos esses quilômetros. Eu diria que poder viver intensamente essa aventura, mas poder me manter conectado ao meu mundo cotidiano, me fez exercitar o equilíbrio que acredito ser necessário durante toda a nossa vida.
Algumas pessoas sonham sonhos lindos pela vida toda, que muitas vezes acabam não podendo viver de verdade por falta de tempo.
Planejam a realização de algumas coisas durante boa parte de suas vidas, e quando podem concretizar, já não tem mais condições de desfrutar plenamente.
É como trabalhar a vida toda para viver de verdade depois da aposentadoria.
Certamente, uma escolha com baixo nível de conhecimento do que é a vida.
Acredito fortemente que devemos buscar o equilíbrio desde cedo entre trabalhar bastante, construir, lutar, e viver a vida com plenitude. Viajar, conhecer, estudar, e conviver o máximo possível.
Fácil isso não é. Mas impossível, também não.

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